O CALVÁRIO POR UM DIREITO
1)
Entendendo o caso
Faleceu em 23 de Setembro de 2001 na cidade de Santo Amaro da Imperatriz dona Adelaide Steinbach da Cunha, mãe de onze filhos - todos vivos e maiores, casada com Francisco José da Cunha - já falecido, do qual recebia uma pensão mensal decorrente da aposentadoria rural junto ao INSS (benefício nº 01-91842865-3) no valor de um salário mínimo ou seja R$ 180,00.
Tal pensão era recebida mensalmente por um de seus filhos - Ely Pedro da Cunha na condição de procurador cujo valor era depositado em conta bancária para fazer face às despesas com remédios de dona Adelaide.
A valor da pensão mensal referente ao mês de setembro (mês do falecimento), apesar de estar disponível no banco para recebimento (O INSS ainda não tinha recebido o comunicado do falecimento) não foi recebido por seu filho procurador por este considerar não ter o direito à pensão integral, ou seja, ter direito apenas ao resíduo correspondente aos 23 dias de setembro.
2)
Em busca do resíduo
Em reunião familiar após o falecimento de nossa mãe, eu, Osli Francisco da Cunha - um dos filhos, coloquei-me a disposição para requerer junto ao INSS o resíduo a que tínhamos direito.
Primeira estação: Dirigi-me à agência do INSS na rua Esteves Júnior em Florianópolis para obter informações sobre como proceder para receber o resíduo. Fui atendido por uma funcionária do setor de informações a qual informou que o resíduo correspondia a 23 dias de setembro mais 9/12 (nove doze avos) correspondentes ao proporcional do 13º salário. O valor do resíduo seria em torno de R$ 273,00 (Duzentos e setenta e três reais). Para o recebimento eu teria que colher a assinatura de meus 10 irmãos com o assentamento do número da Carteira de Identidade de cada um em documento fornecido pelo próprio INSS.
Segunda estação: De posse do modelo de documento começou a fase de coleta das assinaturas, tarefa não muito fácil, pois meus 10 irmãos residem em vários pontos de Santa Catarina. Porém, com o advento das festas de fim-de-ano a tarefa foi completada.
Terceira estação: Em meados de Janeiro de 2002 retornei contente ao INSS com a tarefa cumprida e pronto para receber o resíduo. Tal não foi a minha desagradável surpresa quando atendido por outra funcionária do setor de informações ao dizer que eu tinha que trazer também uma cópia “Xerox” da carteira de identidade de cada irmão. Pensei em abandonar a reivindicação do direito mas fui incentivado pela funcionária que me atendeu para não fazê-lo.
Quarta estação: Desta vez eu não tinha as festas de fim-de-ano para facilitar a minha tarefa. Mas, com o uso do Fax, correios e a colaboração de todos os meus irmãos concluímos com êxito mais essa tarefa.
Quinta estação: Em abril de 2002, retornei com a documentação completa - minha e de meus 10 irmãos à agência do INSS. Sempre após esperar com a senha apropriada para ser atendido no setor de informações, fui chamado para tal. Desta vez um funcionário me atendeu e após ouvir meu longo relato, me tranqüilizou dizendo que o resíduo seria disponibilizado em agência bancária do Banco do Brasil provavelmente na segunda feira da semana seguinte. Porém, eu deveria deixar o nº de meu(s) telefone(s) para que o funcionário da tarde que iria fazer os cálculos pudesse entrar em contato comigo no mesmo dia. Deixei três nºs de telefones.
Sexta estação: Como passaram-se dois dias sem o prometido contato e eu sem protocolo algum em mãos, resolvi ir pessoalmente no terceiro dia ao INSS. Fui atendido, como sempre através de uso de senha, por uma funcionária do setor de informações. Após uma longa procura encontraram meu pedido na mesa do tal funcionário da tarde que iria fazer os cálculos do resíduo. Como eu estava ali no período da manhã fui encaminhado para a chefe do setor de benefícios (Sra.Rejane) para saber do resultado. Fui atendido pela Sra. Rejane que educadamente me transmitiu que o direito reivindicado não é liberado administrativamente e que somente seria pago com autorização judicial através de um alvará. Vendo meu suplício, ela sugeriu, como alternativa, que eu me dirigisse ao prédio da Justiça Federal e procurasse um Juizado de Causas Previdenciárias ou órgão assemelhado e o problema poderia ser resolvido em menos tempo que no Fórum.
Sétima estação: No dia seguinte fui até o referido órgão junto à Justiça Federal onde relatei com detalhes meu pleito e minha caminhada até o momento. Após uma consulta verbal, feita pela funcionária que me atendeu, à uma juíza do órgão, foi constatado que o assunto não era de competência da Justiça Federal e que eu deveria requisitar o alvará judicial no Fórum da Universidade Federal de SC (UFSC) ou no Fórum da Capital no centro de Florianópolis.
Oitava estação: Como resido no bairro da Trindade junto à UFSC, escolhi o Fórum da Universidade para continuar pleito. Ao entardecer do dia seguinte dirigi-me ao setor de protocolo do Fórum para dar entrada no pedido do alvará judicial e então fui informado que somente através de Advogado é que eu poderia fazê-lo. Alegando o pequeno valor da causa (aproximadamente R$273,00) o qual não justificaria o pagamento a um profissional do direito, fui aconselhado a recorrer à Escritório Modelo de Assistência Jurídica (EMAJ) - organismo da UFSC que presta serviços jurídicos gratuitos.
Nona estação: Na primeira manhã da semana seguinte fui ao citado escritório para mais um passo na caminhada para realização de meu intento. Ao relatar meu objetivo, fui esclarecido por um aluno modelo que causas previdenciárias eram atendidas por alunos da sexta fase do curso de direito e que no momento eles não existiam - os alunos da sexta fase já haviam passado para a sétima e os da quinta fase ainda não haviam concluído a mesma devido a greve dos professores. A sugestão foi que eu voltasse ao final de maio que talvez a situação estivesse resolvida ou me dirigisse ao Fórum da capital no centro de Florianópolis.
Décima estação: Na manhã do mesmo dia, fui até o Fórum do centro e obtive, na recepção, a informação de que o meu caso era para ser tratado no juizado de pequenas causas no décimo andar do mesmo prédio porém, o que o expediente do Fórum é somente no período vespertino.
Décima Primeira estação: Na semana seguinte, retornei ao Fórum, desta vez no período da tarde, e fui encaminhado com uma senha para sala de espera a fim de ser atendido por uma assistente social que encaminharia o caso. Aliviado fiquei quando uma moça veio até a porta e falou: verde 19. Aquela era a minha senha.
Décima Segunda estação: Ao entrar na sala da assistente social Sra. Tânia fui me apresentando e iniciei o relato passo-a-passo de todo o meu caso. Afinal, penso que uma das principais tarefas de uma assistente social é ouvir. Ela fez algumas perguntas e considerações sobre o caso dizendo-se surpreendida com tantos erros de encaminhamento do caso, principalmente do INSS que deveria saber que o caso é resolvido somente com alvará judicial. Relatou ainda que eu precisaria de um advogado e perguntou se eu tinha algum amigo com essa profissão. Aleguei que não possuía essa condição e que pretendia ser atendido por um advogado público, mesmo porque o pequeno valor da causa (R$ 273,00) não justificaria outra alternativa. Porém, ela alegou que o dado o valor da minha remuneração mensal não caberia os préstimos de um advogado público, que só atende pessoas de baixa renda.
Décima Terceira estação: Mais tarde, consultei um advogado que desaconselhou entrar com o pedido do alvará judicial, que apesar de ser um procedimento até certo ponto simples, é moroso e que as despesas com os honorários e com custas judiciais (acima de R$50,00 cada uma) não compensam. Mesmo assim, ele colocou-se a disposição para efetuar o trabalho.
Décima Quarta estação: Considerando todo o desgaste físico, profissional e emocional que tive durante a caminhada resolvi abandonar o caso via alvará judicial e estou encaminhando requerimento acompanhado de toda a documentação providenciada e este documento com cópia para o Superintendente do INSS de Santa Catarina e o Gerente Executivo de Florianópolis.
3)
Considerações Finais
Se meu irmão, como procurador de minha mãe, ao agir de uma forma tão honesta não recebendo no banco o valor integral da pensão referente ao mês de setembro tivesse recebido e devolvido o excesso ao INSS teria evitado toda essa burocracia que causou tanto desgaste sem nenhum retorno até agora. Porém, nunca devemos nos arrepender por agirmos honestamente ficando tranqüilos com nossa consciência.
Estou ciente que normas internas devem ser respeitadas (O INSS negar administrativamente tal pleito com o intuito de evitar fraudes, etc.) porém, poderão ser ajustadas para que a liberação de pequenos valores seja desburocratizada.
Encaminho este documento ao INSS muito mais para relatar o calvário de um cidadão comum do que alimentar esperanças de receber o resíduo. Agindo assim, espero estar contribuindo com futuras reformas de procedimentos internos de nossas instituições no tratamento de casos semelhantes.
Florianópolis, 9 de maio de 2002.
Osli Francisco da Cunha
Telefone 3233-2249
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